A app que surgiu em 2016 e conquistou os jovens durante os confinamentos provocados pela pandemia chegou agora à lista de alertas de vários Estados enquanto ferramenta de espionagem.
O “balão” rebentou
As relações sino-americanas sempre se caracterizaram pelos momentos de cooperação – como foi o caso do combate às alterações climáticas e ao terrorismo – e de tensão – em temas como as disputas comerciais e questões geopolíticas, sobretudo na situação de Taiwan e no Mar do Sul da China.
Quero com isto clarificar que o escrutínio ao TikTok não acontece sem fundamento.
A 2 de fevereiro do presente ano, um balão de espionagem (inicialmente descrito como sendo um dispositivo civil para uso meteorológico, pelas autoridades chinesas) foi detectado a sobrevoar o estado do Montana, nos EUA. Dois dias depois, o polémico balão foi abatido junto à costa de Surfside Beach, no estado da Carolina do Sul.
Tal acto aconteceu após as autoridades norte-americanas terem afirmado que o balão era, efectivamente, um instrumento de espionagem utilizado no âmbito de uma operação do Exército de Libertação Popular da China (o exército chinês) que tem vindo a colectar informações militares de países aliados dos EUA, como o Japão, a Índia e as Filipinas, nos últimos anos.
Um Deja Vu
Voltando à app, quando juntamos “telemóveis” e “espionagem” na mesma frase, o caso que nos surge na memória é o do spyware Pegasus. O software de espionagem israelita comprometeu o smartphone do Primeiro-Ministro espanhol Pedro Sánchez e também o da Ministra da Defesa, Margarita Robles. Este programa desenvolvido pela empresa NSO Group, sediada em Tel Aviv, funciona por controlo remoto através do qual o atacante pode dar a ordem de ler SMS ou chamadas, aceder às fotografias e informações de redes sociais, localizar o dispositivo via GPS ou mesmo obter palavras-passe do mesmo.
O que se teme?
Dois em cada três jovens americanos tem TikTok. É este o ponto de partida através do qual o FBI, na pessoa do seu director Christopher Wray, manifestou preocupações de segurança nacional em relação ao TikTok, na medida em que o controlo desta rede social pertence a um governo que não partilha os mesmos valores que os americanos – o chinês. Estas preocupações são sustentadas pelo argumento de que Pequim utiliza a partilha de vídeos como ferramenta para recolher os dados dos seus utilizadores, que, futuramente, poderão ser factores chaves para o desbloqueio de operações de espionagem.
A própria empresa dona do TikTok, a ByteDance, afirmou que o seu departamento de segurança deu início ao “Projecto Raven” de modo a identificar e despedir os funcionários envolvidos no acesso a dados pessoais de jornalistas americanos que trabalharam no BuzzFeed News. Este incidente ocorreu em Junho de 2022 e desde então que as relações EUA-China, nesta matéria, se têm intensificado.
App Non Grata
Para além da Comissão Europeia e da NATO, também países como Afeganistão, Alemanha, Austrália, Bélgica, Canadá, Dinamarca, França, Estados Unidos, Índia, Paquistão, Reino Unido, Suécia e Taiwan optaram por suspender ou banir o uso da rede social do momento por parte dos seus funcionários.
+Segurança ou +Insegurança?
Esta abordagem do Ocidente (fomentada pelos EUA) pode surgir de forma a implementar um proteccionismo, ao estilo do que aconteceu com a Huawei, que foi obrigada a retirar o sistema operativo android dos seus dispositivos, dada a sua relevância face a empresas americanas.
O TikTok constitui um ameaça à nossa segurança, mas não está só. Todas as apps pedem permissão de acesso a informações do utilizador, desde aplicações de personalização (widgets e wallpapers) até jogos, passando pelas redes sociais que, logicamente, exigem mais permissões – seja o microfone, a câmara, a localização, os contactos, as mensagens, entre outros. Dentro desta categoria inserem-se aplicações como o Twitter, o WhatsApp, o Facebook e o Instagram, o que nos remete para outra questão: iliteracia digital por parte do utilizador.
O busílis da questão reside no facto de o TikTok pedir acesso a dados biométricos como o reconhecimento facial e a impressão digital, bem como a localização por IP geo-referenciada, outros dispositivos presentes na rede do utilizador, o histórico de pesquisas, entre outros, e ser uma empresa chinesa o que, de acordo com a lei do país, significa que é obrigada a partilhar informações sobre os utilizadores com o governo.
Neste sentido, diria que os dois principais grandes riscos de segurança com o TikTok estão no facto de este constituir não só uma rede social, mas também uma plataforma de comunicação, factor que permite a difusão de uma agenda específica; e na alteração conceptual da aplicação, de modo a transformá-la numa arma, aquando de uma eventual escalada de tensões entre a China e o Ocidente.
Assim, fica a cabo de cada um de nós confiar os dados a uma empresa americana ou a uma empresa chinesa.
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